Mondo #7: 5 Motivos para evitar se comparar com os outros
É preciso cultivar a criatividade e o reconhecimento à sua própria maneira. E ainda: Nirvana, Austin Kleon, Red Hot +, Tóquio, fotografias, TED, Stylist magazine
Ano 1 • № 7 • 01 de outubro de 2020
COM QUE FREQUÊNCIA VOCÊ SE compara com os outros? Se for meio como eu, mais do que gostaria de admitir. E, como você deve ter notado (eu notei, por isso escrevo), esse processo de comparação nunca parece ser algo bom, nem funcionar muito bem, não é? Ainda mais agora, neste ano tão incomum, quando estamos já há seis meses dentro de casa, com outras perspectivas e na ansiedade de que tudo termine logo. Só que é preciso aprender a controlar nossos "gremlins" interiores, os pensamentos sabotadores que mais parecem com aquelas criaturinhas sinistras dos filmes homônimos dos anos 80/90. É sobre se cuidar um pouco, a fim de seguir adiante e ir tocando as tarefas do dia a dia, para que seja possível equilibrar nosso papel como pessoa e profissional nestes tempos tão superconectados.
Percebo, já há algum tempo, que a vida digital e o trabalho online de cada dia nos incentiva a adotar uma postura de constante comparação em relação a nossos colegas, amigos e outras pessoas que admiramos, por diversas razões. Em alguns casos mais extremos, a comparação se dá mesmo com estranhos — culpa das redes sociais e da cultura da imagem que promovem uma vida e uma carreira “perfeitas”. Pura bobagem, no fundo sabemos. No entanto, seguir nesse comportamento de comparação com os outros pode ser algo perigoso para a saúde mental e a autoestima. Pode, ainda, sufocar nossa criatividade.
Um filme que vai bem direto ao ponto nesse assunto é Ingrid Vai Para o Oeste (2017). Se ainda não assistiu, recomendo, está no Netflix. Mostra a obsessão pela comparação através das redes sociais, num nível bastante brutal e facilmente plausível — impossível não entender que o que é mostrado, da forma como é mostrado, existe.
É preciso que fique claro que é saudável ter modelos que valem a pena serem seguidos, tanto na vida, quanto no trabalho. Mas, quando alguém se esforça para se tornar a “reprodução perfeita” de outra pessoa, a individualidade sofre. Nós somos diferentes por natureza, e é justamente essa diferença que nos torna interessantes aos olhos dos outros.
Além disso, todos os caminhos que seguimos para chegar a determinado objetivo — nossas experiências — também são diferentes, sendo que somos a soma dessas diferentes circunstâncias e de eventos fortuitos. Levando isso em consideração, a comparação desmedida se torna uma coisa absurda, não acha?
Portanto, se for o seu caso, aqui estão algumas coisas que você pode fazer para se livrar dessa armadilha da comparação:
Encontre sua própria verdade e busque satisfazê-la
Ao querer ser outra pessoa (ou ser mais parecido com outra pessoa), você está se subjugando e se deixando para trás. Por um lado, você nunca será (você é você!). E, além disso, tampouco alcançará a individualidade que vem de quem você admira, ao seguir cada passo e cada ato de outra pessoa. A grande questão é não tentar ser quem você não é — apenas tente ser você mesmo. É sua única escolha e já é muita coisa, acredite. Qualquer outra tentativa diferente dessa é até uma forma de procrastinação, de deixar de tratar seus próprios problemas e anseios. É também uma aposta segura em se tornar alguém desinteressante.
Use um pouco menos as redes sociais
Através das lentes cor de rosa das redes sociais, as pessoas estão sempre projetando as supostas “melhores versões” de si mesmas. No fundo, todos podem estar lutando da mesma maneira que você ou eu, mas deixando esses pequenos detalhes fora da narrativa social. Afinal, já não é mais segredo algum que as pessoas geralmente sofrem mais do que os olhos vêem e têm vidas muito mais confusas do que suas contas no Instagram ou seus perfis no Facebook ou LinkedIn tentam mostrar. Nunca estamos tão sozinhos quanto imaginamos e ser um profissional em atividade nesse mundo digital — talvez mais do que em qualquer outro momento da vida — é descobrir quem de fato somos e o que queremos.
Defina seus próprios critérios sobre o que é o sucesso
Meça de acordo com seus próprios benchmarks. Considere perguntar a si mesmo: o que eu faço está me trazendo alegria? Eu gostaria de ler isso? Eu ficaria chocado se este texto aparecesse em um site de grande alcance ou na rede social de algum influenciador? Isto faz parte da minha história? Este trabalho tem relação com qualquer outra coisa que eu já fiz? Este texto reflete quem eu sou?
A definição do que é o sucesso pode ser medida de acordo com suas regras e, diferentemente do objetivo de ser “tão bom quanto” aqueles que você admira, essa prática não depende da aprovação dos outros. Defina seus próprios critérios para o sucesso e você poderá encontrar um caminho que é claramente seu: deixe que os outros escrevam bobagens nas suas próprias redes, que tentem passar a imagem de um “influenciador social” no LinkedIn ou que postem coisas com o único objetivo de conseguir curtidas. Lembre-se que o objetivo é ser você mesmo. Além de manter sua saúde mental, este exercício ajudará a definir sua imagem, seu estilo, seus valores estéticos e de criação e as diretrizes para o seu trabalho.
Olhe para dentro de si
Se você pensar em se comparar, prefira refletir sobre o seu trabalho ao longo do tempo. Pense em seus projetos e suas criações passadas — você pode se surpreender ao notar até onde chegou e o que já fez. Pode também ficar impressionado com algumas das qualidades de seus primeiros trabalhos que até mesmo já esqueceu (e que é sempre saudável revisitar). Eu nunca deixo de rever alguns dos meus primeiros trabalhos, textos e projetos de tempos em tempos. Isso, depois de quase vinte anos criando conteúdos, imagens, visuais e escrevendo para os mais diversos fins e as mais variadas empresas. É uma forma lúdica de satisfazer minha curiosidade na busca pela minha própria identidade e refleti-la nos novos trabalhos. É um pouco de consistência, também.
O que me leva a concluir que um profundo olhar para dentro de si mesmo pode ser infinitamente mais recompensador do que olhar para fora. Do que se comparar. Convide-se a abrir mão desse artifício e mergulhe nas suas questões: seja você mesmo, viva você mesmo.
Reconheça o mérito das pessoas com quem você se compara
Outra ótima maneira de superar o impacto negativo de nos compararmos com os outros é "estender a mão" para eles com um reconhecimento genuíno. Certa vez, depois de conhecer o trabalho de um designer e escritor que já admirava no LinkedIn e passar alguns minutos me sentindo mal comigo mesmo pela comparação, acabei entrando em contato com o cara, reconheci o ótimo trabalho que fazia e perguntei se poderíamos nos conectar — ele aceitou de imediato e com muita simpatia e generosidade. Foi bom e libertador fazer isso, mas nem todas as pessoas têm esse caráter. O que vemos muito nesses tempos é gente que passa uma imagem fake, que vive de posts "caça-likes" e sequer tem a humildade de responder a contatos ou comentários. Esqueça esses — não são autênticos. Por outro lado, quanto mais reconhecimento tivermos com o sucesso, talentos e experiências de outras pessoas, desde que de uma maneira honesta, maior será a probabilidade de manifestarmos sentimentos e resultados positivos em nossas próprias vidas.
Por fim, sendo bem direto: apenas não se compare mais. ■
Mix
O que li nos últimos dias: Se você é professor(a), conheça quatro dicas, no Vox, para que o aprendizado remoto seja mais eficaz, de acordo com escolas americanas. @@ Quem criou aquele smiley (foto acima) que se tornou o logo do Nirvana? O Los Angeles Times mostra que, agora, tem um artista que afirma que ele é o dono da criação. @@ O Fast Company lista alguns motivos para sair da zona de conforto. Sabemos que sempre é bom, mas vale ler mesmo assim. @@ 30 anos depois do 1º disco do projeto Red Hot, que arrecadava fundos para instituições de caridade em apoio aos que sofriam com HIV/AIDS, a Esquire revisita as melhores músicas. Lembra que já tivemos um Red Hot + Rio, em 1996? @@ O Tab mostra como cartunistas famosos lidam com a realidade do momento no Brasil, com seus desenhos. @@ As novas lives e experiências online que os artistas criam para sobreviver. Na Época Negócios. @@ Estou relendo, ao mesmo tempo, os dois livros do Austin Kleon (@austinkleon) que adoro: Roube como um artista (ótimo) e Mostre seu trabalho! (inspirador!). @@ Quino, o cartunista argentino criador da Mafalda, partiu ontem. Seu trabalho fez parte de várias aulas que tive na faculdade. RIP. @@ Kapow! ✘ Alexandre Bobeda
Falando em Mafalda…
Play
O que curti nos últimos dias:
Estas fotos alucinantes de Tóquio, no site do jornal holandês Volkskrant.
A versão online do Photoworks Festival, uma exposição de fotografias que acontece na Inglaterra anualmente.
Ainda fotos: no The Guardian, este slideshow com o trabalho de Ron Cobb, o cartunista que virou designer de produção em filmes icônicos, como Alien, Total Recall, Star Wars, Conan, De Volta Para o Futuro etc. Cobb faleceu na semana passada. RIP 🙏🏻.
Neneh Cherry, uma das “favoritas da casa”, em I’ve Got You Under My Skin.
O marketing bizarro da Liquid Death, uma marca de água mineral americana que vem em lata e abusa de caveiras, heavy metal, sangue e cabeças cortadas. Curioso!
Esses planos de fundo gratuitos para usar no Zoom, do Studio Ghibli, são alucinantes!
Por que especializar-se numa carreira tão cedo pode não ser uma vantagem? O jornalista americano David Epstein, autor do livro Range: Why Generalists Triunph in a Specialized World, tenta explicar o motivo neste vídeo bem instigante. Me identifiquei demais, já que me formei numa coisa, já fiz dezenas de cursos de outras e acabo trabalhando em projetos bem diferentes. Para ele, o tenista Roger Federer é um bom exemplo: tênis não foi seu primeiro esporte, o que lhe deu a chance de experimentar e se desenvolver na carreira que o consagrou. A frase-chave, para mim, foi “um indivíduo com experiências variadas não pode ser substituído completamente por um time de especialistas.”
Olha Isso
A capa da edição de outubro da revista feminina inglesa Stylist. Além de ser minimalista e dizer muito com menos (o tema é o futuro pós pandemia), é totalmente conectada ao zeitgeist, o clima do momento, ao usar um emoji bastante comum para ilustrar o sentimento das pessoas, que passam mais tempo em conexões online.
E ainda…
GIFInspiração
Passando raiva nas redes sociais
Quem nunca? 😌
Como foi pra você esta edição da Mondo?
Leio todos os comentários, então pode escrever tudo o que vier à mente!
Mondo é uma newsletter que evita comparações, mas enviada num dia incomparável como a quinta-feira. Encaminhe-a para um amigo que se prepara para o fim de semana!
Obrigado por ter chegado até aqui. Obrigado por estar aqui.
Tem comentários? Eu adoraria saber as suas opiniões: fica à vontade para entrar em contato e contar suas impressões, viu? Ou dizer qualquer outra coisa. É só escrever para hola@houseofx.com.br.
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Imagens: [Texto principal: Getty; Giphy | Mix: Nirvana; Quino/El Mundo | Olha Isso: Stylist Magazine/Shortlist Media | GIFInspiração: Giphy]
Mondo é um produto do estúdio House Of X.